terça-feira, 14 de outubro de 2008

As Terras Irmãs


Home bittersweet home. Voltar para Milão depois de um fim de semana destes pode ser um pouco deprimente. É como voltar para a rotina depois de umas férias de sonho. Mas, falando a verdade, eu ainda não tenho nada que se possa chamar de rotina. Vero vero..
Por onde começar, tanto se passou e tanto aconteceu que as memórias ainda recentes da viagem estão um pouco difusas e apagadas. Diz-se que a nossa memória funciona melhor quanto a recordações mais longínquas no tempo e pior quanto às mais recentes. Talvez por tudo estar ainda tão fresco e tão "perto". Sempre posso ir fazendo actualizações futuras caso me lembre de mais alguma coisa relevante.
Sábado acordámos (get used to this sentence) às 5h da matina. Ou melhor, eu acordei, olhei para o despertador e disse para mim mesmo que eram só mais 5 minutinhos mãe. Uma hora e meia passou e com uma pergunta inocente da Rita "Não deviam acordar?" acordei sobressaltado e com ganas de matar alguém. Mas isso ficaria para depois. Primeiro tinha que tomar banho, acordá-los e fazer a mala. É claro que a meio da algazarra matinal apareceu dentro de mim o Sr. Stressado. O Senhor! Acho que nunca me tinha despachado tão rápido a me aprontar e por isso ainda esperei uns minutos na entrada. Tempo suficiente para me desesperar. Faltavam 20m para o comboio e ninguém parecia preocupado. Solo io. É claro que já na estação não encontrámos, nas caixas automáticas, o destino que o Luís nos tinha dito. Deiva Marina era o seu nome e muito me ri (para dentro) quando me disseram que a terra se chamava assim (agora que noto, não tem assim tanta piada). Dirigimo-nos às bilheteiras para comprar "manualmente" os bilhetes e afinal a estação-destino chamava-se Monterrosso al Mare. Belo nome pensei eu, e ri-me outra vez para dentro (o que foi estranho). Metemo-nos no comboio com as pequenas mochilas e bem agasalhados. Eu ainda estava adoentado e CinqueTerre, pelas fotografias, devia ser um local fresco com uma constante brisa marinha. ERADO. Depois de 3h30m, com uma mudança de comboio a meio, o calor apertou feito estúpido e quando chegámos deparámo-nos com uma praia mesmo à frente da estação. A visão do mar deixou-me muito entusiasmado. Quando cheirei a tal brisa marinha (mas quente) senti-me um pouco em casa e percebi o quão habituado a Portugal eu estava e estou. A falta de mar em Milão é um dos pontos negativos na cidade. Não há uma referência geográfica e o ar é mais encafuado. Mas voltemos à tal praia.
Como não queria apanhar sol na cabeça, pois tinha medo que começasse a ficar com febre (é assim que começa. Um bocado de sol e estás feito), tapei-me com o capucho do meu casaco, mas o calor tornavasse cada vez mais insuportável. Tirei os sapatos, meias, arregacei as calças à marinheiro e livrei-me do casaco. Fomos até à beira mar molhar os pés e sentimo-nos na nossa terra natal. A água estava optima e percebemos o quão estúpidos tinhamos sido em não ter trazido fato de banho e chanatas. RAIOS. Ah, um pequeno aparte. O Diogo não chegou ao mesmo tempo que nós a Monterrosso. Quando mudámos de comboio, ele resolveu apanhar o comboio não no binário 1 mas no binário 2. Ou seja, a Rita chegou a ver uma pessoa a bater na janela do comboio passante. Motivo para umas boas risadas.
Voltando para a praia. Depois de comermos umas bolachas, o Luis, Francisco, Marta e um novo amigo, o Diogo (outro Diogo. Isto de não se por apelidos pode tornar a minha vida complicada), apareceram finalmente na praia. Todos preparados para aquele clima e temperatura que se fazia sentir, vinham de chinelos e fato de banho. E comida! Frango, pão, queijo e coca colas. AVISO: Durante todo o fim de semana não gastei quase nenhum dinheiro em comida e o que comi foi pão com queijo o tempo todo. Pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar. FIM DO AVISO
Preguiçámos calmamente na praia e depois de eu tirar uma boa dose de fotografias ao Francisco (que é como já disse o mais chato modelo fotográfico que já conheci) resolvemo-nos por a andar. Fui descalço como os meus pés tanto gostam e usei a minha planta calosa de maneira a nunca me magoar. AVISO: Todos os turistas olharam com horror para os meus pés. Eles calçavam botas de montanha. Os meus pés riram-se só de imaginar o calor que eles estavam a sentir. FIM DO WARNING. Quando chegámos ao topo, a uma espécie de miradouro da cidade, pudemos ver o quão transparente era a água e o quão suados nós estávamos. Falando em suor, o Diogo, que se tinha enganado no comboio, lá conseguiu chegar a Monterrosso e quando o vi pensei:"Nunca tive o prazer de observar alguém tão suado". Acho que mais para a frente piorou, porque, com as botas calçadas e o casaco vestido, a meio da caminhada ele podia ter mudado o seu nome para Sr. Suado Pocinhas. Espero que ele não leve a mal se ler isto, mas precisava de ser dito!
Chegámos a uma pequena vila, com uma pequena praia, que não me marcou muito. Assim foi, pois nem me lembro do seu nome. Passámos por ela sem dizer olá nem adeus e começamos a subir um caminho que fazia lembrar os vales de um campo qualquer em Portugal. Ao que parecia tinhamos de pagar 5euros para fazer aquela caminhada com destino a Vernazza. Ok, acho o preço um bocado elevado, mas como poderíamos nós atravessar aquilo? Por outro lado, será que valeria a pena dar 5 euros quando eu já era conhecedor das caminhadas intermináveis do Luis? Sh*t. Paguei e calei-me. Ou melhor, o Luis pagou-me porque eu não estava na posse de papel chamado dinheiro. LETS GO!
Ainda descálço, andei e andei como um cão vadio. Subimos escadas, escalámos colinas, dançámos o vira, e o melhor é que suámos mais um bocado (foi nestes momentos de intenso inferno que o Diogo se tornou numa poça no chão. Muito engraçado). Ao fim de uma hora, podia dizer que já tinha tido a minha dose, mas o caminho parecia não querer acabar. A Maria teve uma pequena crise de asma, mas quando lhe passou, acho que ficou ainda mais enérgica, substituindo a sua cabeça por um pequeno tomate maduro. As nossas costas, coladas à mochila, e molhando-a toda, estavam cada vez mais arqueadas de tanto caminhar. Eramos os pequenos corcundas da montanha, menos o Luis que, já habituado àquelas andanças que podiam matar qualquer um, continuava sempre na dianteira, assobiando com prazer. A Rita parecia ter perdido o espírito e alucinava com um descanso na sua casa. Boring. Já mais no final do caminho, o Francisco, também descalço, resolveu tropeçar e abrir um bocado do seu dedo do pé. Não era uma visão bonita de se ver, acreditem. Mas ele continuou, deixando um rasto de sangue pelo caminho. Assim, nunca poderíamos dizer que estávamos perdidos, não é?
Ao dobrar a esquina, depois de o Luis gritar de alegria, avistámos a nossa segunda terra a visitar. Vernazza. O esforço valera a pena e naquele momento só nos apetecia um banho de mar. Estávamos porcos, sujos, mas não muito mal cheirosos. Entrámos na vila, pelas suas estreitas ruelas, onde se podia ver as casas amontoadas, estando nós, rapazes, em tronco nú. É claro que, já na praceta e sentindo que ninguém estava a aderir àquela moda, resolvi vestir a t-shirt. Para além disso, o calor tinha desaparecido rapidamente devido às sombras das casas, tal como a vontade de mergulhar. Descansámos um bocado e partilhei as minhas bolachas com quem quisesse. A vila estava animada e a cor dos barcos e das casas eram muito vivas. Todo o ambiente fez-me lembrar alguma cidade localizada mais nos trópicos, onde se podia colher uma banana ali mesmo no meio da praça.
Demos uma volta pelo cais, procurando um sítio onde se pudesse tomar banho mais discretamente, visto que Maria, Rita, João e Diogo não tinham trazido fato de banho e assim tomariam de roupa interior. PARTY! er não. Até foi um pouco deprimente. Mas, por outro lado, foi uma iniciativa interessante e que vai ser relembrada mais tarde. Eu fiquei-me pelas vistas, já que também não tinha fato de banho e estava mais constipado que uma vaca. Gostei de ver o casal, Diogo e Rita, a ajudarem-se mutuamente a subir uma rocha, o Franciso a posar para as fotografias, mesmo em momentos de saltos artísticos, e o João a fazer amonas à Maria. Valeu a pena. O pior foi a quantidade de turistas, que pretendiam apanhar o barco, que ficaram especados a olhar para um bando de jovens com saúde a banharem-se apenas nas suas vestes mais privadas. Um espectáculo bonito de se ver, ironizo eu. hehe. Depois de toda a gente usar a minha toalha e de a deixar encharcada de mais para eu me poder secar minimamente (nem no dia seguinte a maldita secou), continuámos o nosso caminho para o próximo destino. Para não faltar à regra, não paguei o bilhete de comboio, entrando para uma apertada carruagem cheia de turistas com sede de poder. 5 minutos durou e por isso, localizando o pica antes de entrar no comboio, não tive muito medo de ser apanhado com as calças na mão, ou melhor, sem o bilhete para pagar. Chegámos a Corniglia! Sempre acompanhados pelo mar, presente constantemente ao nosso lado. As estações de comboio são quase todas ao lado do mar, e por isso, temos sempre uma optima vista durante a viagem.
Para chegar a Corniglia, tinhamos que subir o inferno em escadas. Todas em ziguezague até ao topo, onde ficava a terreola. Ganhei coragem, e subi um degrau.. e depois outro.. e depois mais 300 e lá em cima fiz a minha dança de Rambo. Eye of Tiger! É claro que os cidadãos de Corniglia não gostaram muito da minha dança pois não eram os maiores fãs do Rambo. Nem eu. Enfim, a Rita, já cansada e farta de mandar vir com toda aquela terra dos diabos resolveu que já tivera a sua dose de escaladas, deixando-se ficar calmamente a meio das escadas. Explorámos a vila, que não era uma locura de prazer visual, e fomos para um miradouro. O sol estava-se quase a por e deixem-me ser um pouco foleiro e dizer que nunca tinha visto um por do sol tão fantástico (esta nem é a palavra certa, se alguém quiser usar outra..). Parecia mesmo que o sol estava sobre o mar, reflectindo a sua sombra luminosa nas águas. Muito bom. Ainda no miradouro, encontrámos uns amigos da Marta americanos (não sei se eram todos, mas sei que um era por isso generalizo) que estavam também a estudar em Bolonha. É claro que passei rapidamente do português, não para o italiano, mas para o inglês. Lingua que falo com a ligeireza de um bom pirata britânico. Partilhámos pão com queijo (vêm?) e pusemo-nos a andar. A noite já caíra e por isso tinhamos de partir para a próxima terra.
Apanhámos o comboio para Manarola. Acho que é díficil explicar a beleza de todas estas vilas. Penso que se tem de ir lá e experienciar o que tenho estado a falar. A paisagem de noite de Manarola, com uma lua cheia sobre a vila, era quase surreal. Tinhamos vindo na altura certa, em que não havia uma abundância de turistas e podíamos tentar pertencer àquela vila, onde nunca antes tinhamos posto os pés. Tinhamos fome, estávamos cansados mas mesmo assim quisemos ver mais. Deixámos a paisagem de Manarola para trás e ainda guiados pela luz da lua, caminhámos.
Andámos por um passeio na falésia (acho que era este de que falávas Catarina) e vimos a lua cheia reflectida no mar. Gostei mesmo muito desta fase da viagem. Não estava calor, mas a noite estava com uma temperatura ideal e não se via ninguém por aqueles lados, o que podia ser sinistro, se não se chamasse Via Dell'Amore. Mais uma vez, pude ver milhares de cadeados presos aos corrimões e dedicações românticas escritas nas paredes. Faltavam eram os protagonistas que davam nome à Via.
Resolvemos, ou melhor, o Luis resolveu, com a sua mente infantil, pregar uma partida às três raparigas do grupo. Desatámos a correr para, mais à frente, lhes pregármos o susto da vida. É claro que a Maria e a Rita nos avistaram logo no nosso esconderijo elevado no monte e assim a partida foi um falhanço e o susto ficou sem efeito. Mesmo assim o Diogo ainda deu um berro que as assustou (mesmo já estando todos ao lado delas, er).
Chegámos a Riomaggiore, mas não tivemos tempo para ver muita coisa. Eles comeram qualquer coisa num café perto da estação e eu fiquei-me pelas minhas bolachas que tinham durado o dia inteiro. Desta vez comprei bilhete e apanhámos o comboio mais descansádos. Quem não tinha bilhete ia num stress constante à procura do pica. No fim não apareceu nenhum e arrependi-me de ter comprado bilhete. Mas também nunca poderia saber certo? O Francisco ainda continuava meio em baixo pelo seu dedo rasgado e estava também a morrer de sono. Pobre rapaz.
Saímos em Deiva Marina. A tal vila com o nome estranho. Era ali que iríamos dormir naquela noite. O problema é que até ao camping ainda eram uns bons 40 minutos a pé, e como o autocarro particular já tinha partido, tivemos mesmo que usar os nossos pés. Já agora digo que neste momento tenho os maiores gémeos que já alguma vez tive. Nunca andei tanto.
O camping era grande e teríamos que dormir numa espécie de tendas/casinhas, com chão de madeira e cada uma com duas camas. Entrámos, cada dois na sua, e dormímos com algum frio.

II dia

Não conseguia respirar. O meu nariz entupira por completo e os canais nasais (ou lá como se chamam) suplicavam por ar. Pelos vistos a noite fria tinha-me feito ainda pior e agora parecia estar ainda mais constipado. Fui tomar banho aos balneários e a água estava à temperatura ideal e sem vacilar. Só ali, no meio do nada, é que parecia haver canalizações decentes. Melhor que na minha casa em Milão. Troquei de t-shirt e meias e usei as mesmas calças e sapatos, que estavam num belo estado. Fomos comprar qualquer coisa para comer no minimercado que havia dentro do camping. Mais uma vez, pão com queijo regado com ice-tea. Experimentem e desmaiem de locura. Desta vez, tivemos o prazer de ter um autocarro particular a nos levar até à estação de comboio. Com um "Ciao!" saímos do bus e esperámos na estação pelo autocarro.
Sem bilhete lá fui eu por carris fora. O plano desta vez era ir até Santa Margherita e caminhar até Porto Fino. Talvez, dos dois, tenha sido este o dia que mais gostei.
Santa Margherita parecia já uma cidade, com a sua população sempre em movimento e grandes casas a surgirem em cada esquina. Mais uma vez, viemos parar a uma grande praia. Ah, as praias mediterrânicas parecem ser todas feitas de pedregulhos. Nada como as nossas portuguesas com a sua areia fina.
Porto Fino aí íamos nós! pensei eu. Mas mais uma vez, à minha frente abria-se um caminho interminável com o sol a bater-me na cabeça. Andei, marcando o meu ritmo, e a sombra foi-se cada vez mais instalando, tornando o percurso mais agradável. Pude ter o prazer de à minha frente se abrirem paisagens de sonho, com praias banhadas por uma água quase azul turquesa e atrás, milhares de grandes árvores atentas. As casas, que deviam pertencer a milionários que apreciavam umas boas férias, eram quase todas coladas ao mar e muito bonitas.
Foi com o Francisco que passei a curva e pudemos ver Porto Fino em todo o seu esplendor. À frente da vila havia uma pequena baía onde estavam atracados vários iates, veleiros, barcos, etc. O dia estava muito bom e dava uma luz de verão à vila. . Tendo sido eu e o Francisco os primeiros a chegar ainda esperámos um bocado pelo resto do grupo. Aproveitámos e comemos pão com queijo (sim, já fiz o favor a mim mesmo de deitar todo o pão e todo o queijo para o lixo cá em casa. Não se preocupem). Explorámos a vila e sentámo-nos na praça para descansar. Depois quisemos ir ao miradouro e mais uma vez a Rita não quis ir. O Diogo e a Maria também se deixaram ficar sentados para depois irem todos para uma pequena praia, onde já tinhamos passado, mas que parecia valer a pena (mais tarde soube que a praia já estava coberta em sombra, muahah). Perderam muito! Apesar do caminho ser todo a subir, a vista sob a vila era muito boa e pudémos avistar quase toda a costa
Fizemo-nos à estrada e fomos ter com os três que não quiseram ir lá a cima. Não estavam na tal praia mas numa espécie de jangada de pedra mesmo ao lado de passeio. Mais uma vez, tomavam banho alegremente de boxers, soutiens e cuecas. O melhor é que não eram os únicos.
Depois, Luis, Diogo, Marta e Fransisco tiveram de correr para apanhar o autocarro que os levaria à estação para partir para Bolonha. Não houve despedidas, mas um rápido adeus ao autocarro passante parece ter chegado para percebermos que tinha sido uma grande viagem.
Já no comboio com destino a Milão, adormeci que nem uma pedra e o pica não se dignou nunca a aparecer.

Houve tantas coisas que se passaram mas que não me lembro neste momento... Gostava de dar descrições mais detalhadas e profundas mas é algo que não tenho grande paciência, por isso fiquem com a minha palavra de que Cinqueterre é uma zona que toda a gente devia visitar. Dois dias apenas chegam para saborear tudo aquilo que as vilas têm para nos oferecer.
Gostei muito meus amigos.


1 comentário:

Madalena disse...

Bem, Mart...tu escreves como um louco!!!Ja me fizeste faltar a uma aula (sem querer) por estar tao mergulhada nas tuas aventuras!
QUE--IN-VE-JA!!!!
Nao sabes a inveja que estou a sentir neste momento!!
Mas estou muito contente que estejas a aproveitar tudo da melhor maneira!
Estás a fazer a viagem que eu sempre sonhei fazer, e por isso sinto-me um bocadinho realizada por ti!Que sorte!
Eu ainda nao tive tempo para viagens, mas ja tenho uns projectos.
O mais longe onde fui foi uma terriola chamada Sagunto a poucos quilometros de Valencia com o meu amigo Simone (que por acaso é italiano). Mas nem se pode comparar a essas paisagens que nos mostras em fotografias!
EEENFIM!
Beijinhos e continua a escrever como um louco!